O cálculo de votos para a eleição de vereador leva em consideração conceitos complexos como quociente eleitoral, quociente partidário, média, sobras…
Isso decorre do fato de a eleição de vereadores ser baseada no sistema proporcional de votação, por meio do qual nem sempre quem tem o maior número de votos é eleito. Por isso, um dos maiores problemas de planejar uma campanha eleitoral para vereador é calcular o número de votos necessários para eleger a maior quantidade de candidatos possível. Com o fim das coligações partidárias proporcionais em 2020, esse assunto tornou-se ainda mais relevante.
Para facilitar a definição das estratégias por parte dos dirigentes das legendas e dos pré-candidatos, inclusive para auxiliar na decisão de filiação partidária, o advogado do Barbosa Bezerra Lima Advocacia, Caio Vitor Barbosa, e o consultor contábil Daniel Simonetti elaboraram a Planilha Eleição Vereador 2024.
Baixe a Planilha de Cálculo de Votos para Eleger Vereador em 2024 clicando aqui.
As regras sobre como se faz esse cálculo sofreu várias alterações nos últimos anos, seja por mudanças legislativas e por decisões do Supremo Tribunal Federal. Para buscar compreender como as vagas da eleição proporcional são preenchidas, fizemos um histórico dessas transformações e, em seguida, mostramos como exemplos práticos como se faz essa matemática eleitoral.
Em 2015, para evitar o fenômeno de “puxadores de votos”, que resultava na eleição de vereadores com pouquíssimos votos, foi criada uma regra (art. 108 do Código Eleitoral), a qual determina que, para ser eleito, o vereador precisa ter, pelo menos 10% do quociente eleitoral.
Com essa norma, os vereadores precisam ter um número mínimo de votos para poder ter condições de ser eleito. Mesmo que o partido tenha alcançado mais de uma vez o quociente eleitoral, como se verá a seguir, só obterá vaga se tiver candidatos com votação de 10% do quociente eleitoral ou superior.
Como se verá a seguir, as vagas da eleição proporcional são preenchidas a partir do quociente partidário, o qual leva em consideração o quociente eleitoral. Porém, esse método, em regra, não preenche a totalidade das vagas em disputa nas câmaras municipais e federal e nas assemblias legislativas. Por isso, é preciso definir como são ditribuídas as vagas chamadas de sobras.
A reforma eleitoral de 2017 alterou o sistema de eleição proporcional, alterando o art. 109, § 2º, do Código Eleitoral, permitindo aos partidos que não alcançassem o número de votos do quociente eleitoral participassem da distribuição das vagas de sobra. Essa regra valeu para as eleições de 2020.
Porém, em 2021, outra reforma eleitoral alterou novamente o art. 109, §2º, do Código Eleitoral para estabelecer que somente particariam dessas sobras os partidos que atingissem “pelo menos 80% (oitenta por cento) do quociente eleitoral, e os candidatos que tenham obtido votos em número igual ou superior a 20% (vinte por cento) desse quociente“. Essa regra ficou conhecido como 80/20 e vai valer para as eleições de 2024.
De acordo com essa norma, só participam da distribuição das sobras das vagas não preenchidas diretamente pelo quociente partidário as legendas que alcançaram pelo menos 80% do quociente eleitoral e tenham candidatos com votos que representem pelo menos 20% também do quociente eleitoral.
Sendo que, pode ocorrer de ainda sobrarem vagas a serem distribuídas e os partidos/federações que obtiveram pelo menos 80% do quociente eleitoral não tiverem mais candidatos com 20% desse quociente. Diante desse cenário, entra em cena outra regra, para definir as sobras das sobras.
Essa regra acaba favorecendo partidos com menor expressão ou com candidaturas alternativas, que tenham como estratégia a disputa da vaga de sobra.
Para a eleição de 2022, houve uma mudança nessa questão, criando um critério para participação das sobras que ficou conhecido como regra do 80/20. Porém, ela foi declarada inconstitucional pelo Supremo (saiba mais aqui), e não valerá para as eleições de 2024.
Para entender melhor as regras de cálculo para a eleição desse ano, usamos os exemplos e texto utilizados pelo TSE neste artigo (veja aqui), o qual esclarece os conceitos de quocientes eleitoral e partidário, média e sobras.
A seguir, consideramos esse exemplo e atualizamos as informações levando em consideração as regras de 2024, visto que tal artigo do TSE se refere às eleições de 2016.
O quociente eleitoral é determinado pela divisão da quantidade de votos válidos apurados pelo número de vagas a preencher, desprezando-se a fração, se igual ou inferior a 0,5 (meio), ou arredondando-se para 1 (um), se superior (Código Eleitoral, art. 106)”. Isso significa que:
QE = nº de votos válidos da eleição/ nº de lugares a preencher
Nas eleições municipais, o número de votos válidos será dividido pelo número de cadeiras das respectivas Câmaras Municipais.
Para exemplificar, vamos supor que o número de votos válidos apurados em um pleito de determinado município seja 1.000, e que existam 10 cadeiras a preencher na respectiva Câmara Municipal. Neste caso, o cálculo será o seguinte:
Nº de votos válidos = 1.000 / nº de vagas a preencher = 10, então QE = 100
O Quociente Eleitoral nesse caso é de 100. Como se verá a seguir, esse é o número base para calcular toda distribuição de cadeiras na eleição proporcional.
De posse do Quociente Eleitoral, deve-se calcular o chamado Quociente Partidário. Segundo o art. 9º da Resolução TSE nº 23.611/2019, o “quociente partidário é determinado pela divisão da quantidade de votos válidos dados sob o mesmo partido político pelo quociente eleitoral, desprezada a fração (Código Eleitoral, art. 107).”. Ou seja:
QP = nº votos válidos recebidos pelo partido / QE
Exemplo: se no mesmo pleito o partido recebeu 200 votos válidos, o cálculo será o seguinte:
Nº de votos válidos recebidos pelo partido = 200 / QE = 100, então QP = 2
Após os dois cálculos, é possível concluir que o partido terá direito a duas vagas naquela Câmara Municipal, que deverão ser distribuídas entre os seus dois candidatos mais bem colocados.
O partido/federação terá tantas caderias quantas vezes ele superar o quociente eleitoral. Se numa eleição, o quociente eleitoral for 350, por exemplo, e um partido/federação (votos dos candidatos e de legenda) tiver 701 votos, terá direito a, pelo menos duas vagas, pois fez mais de duas vezes o quociente eleitoral. Se fizer 1.050 votos, terá três vagas, pelo menos, porque alcançou três vezes o quociente. E assim sucecivamente.
Veja o exemplo a seguir para a eleição de determinada Câmara Municipal, na qual existam 10 cadeiras para ser preenchidas e quatro partidos na disputa:
Partido 1 – obteve 200 votos – QP = (200/100) = 2,0 → ele terá direito a 2 vagas
Partido 2 – obteve 140 votos – QP = (140/100) = 1,4 → ele terá direito a 1 vaga
Partido 3 – obteve 350 votos – QP = (350/100) = 3,5 → ele terá direito a 3 vagas
Partido 4 – obteve 310 votos – QP = (310/100) = 3,1 → ele terá direito a 3 vagas
Total de vagas obtidas pelos partidos = 9
Das 10 vagas, 9 foram preenchidas pelo método do quociente partidário. Mas sobrou 1 vaga a ser preenchida. O que fazer com ela?
Em uma eleição proporcional, comumente, após a distribuição das vagas entre os partidos, restam cadeiras para serem preenchidas, as chamadas “sobras”. Estas serão distribuídas por um cálculo conhecido como “Média”.
A distribuição destas vagas que sobraram será feita conforme o art. 109 do Código Eleitoral. Segundo o dispositivo, os lugares não preenchidos com a aplicação do QP e a exigência de votação nominal mínima serão distribuídos para os partidos/federações com maiores médias.
Esse cálculo das médias é feito da seguinte forma: o número de votos válidos atribuídos a cada partido/federação será dividido pelo número de lugares por ele obtido mais 1 (um), cabendo ao partido/federação que tenha alcançado pelo menos 80% do quociente eleitoral e apresentar a maior média um dos lugares a preencher, desde que tenha candidato com número de votos igual ou superior a 20% (vinte por cento) do código eleitoral (Código Eleitoral, art. 109, I, §2º)”. Isto é:
Média = votos válidos recebidos pelo partido /(vagas obtidas por QP + vagas obtidas por média) + 1
Então, seguindo com o nosso exemplo, vamos ao cálculo das médias:
Partido 1 – obteve 200 votos/2 vagas obtidas por QP + 0 vagas obtidas por média + 1 = 66,66
Partido 2 – obteve 140 votos/1 vaga obtida por QP + 0 vagas obtidas por média + 1= 70
Partido 3 – obteve 350 votos/3 vagas obtidas por QP + 0 vagas obtidas por média +1 = 87,5
Partido 4 – obteve 310 votos/3 vagas obtidas por QP + 0 vagas obtidas por média +1 = 77,5
A primeira vaga das sobras foi distribuída para o Partido 3, que obteve a maior média e possui candidato com votação mínima para ser eleito.
De acordo com a legislação, a primeira vaga das sobras será destinada ao partido que obtiver a maior média, conforme exemplo acima. Caso sobre uma segunda vaga, deverá ser feito novo cálculo, mantendo-se o mesmo dividendo e incluindo no divisor do partido que ganhou a primeira vaga mais uma vaga (a da primeira sobra). Em resumo, este novo cálculo será:
Partido 1 – obteve 200 votos/2 vagas obtidas por QP + 0 vagas obtidas por média + 1 = 66,66
Partido 2 – obteve 140 votos/1 vaga obtida por QP + 0 vagas obtidas por média + 1 = 70
Partido 3 – obteve 350 votos/3 vagas obtidas por QP + 1 vaga obtida por média + 1= 70
Partido 4 – obteve 310 votos/3 vagas obtidas por QP + 0 vagas obtidas por média + 1 = 77,5
A segunda vaga das sobras seria distribuída para o Partido 4, que obteve a maior média na segunda execução do cálculo da média e possui candidato com votação mínima.
Esta operação será repetida quantas vezes forem necessárias, enquanto ainda existirem, dentre os partidos que alcançaram pelo menos 80% do quociente eleitoral, candidatos que tenham atingido número igual ou superior a 20% do QE.
O que acontece se ainda sobrarem vagas a serem distribuídas e dos partidos com 80% do quociente eleitoral não tiverem mais candidatos com 20% do QE?
Nesse caso, o Supremo Tribunal Federal deciciu (veja aqui) que todos os partidos/federações que obtiveram votação, mesmo os que não atingiram os 80% do quociente eleitoral.
Esses partidos entram na distribuição, vê-se qual terá a maior média dentre os que tenham candidatos com pelo menos 10% do quociente eleitoral, e tende a se beneficiar aquele partido/federação que se aproximou dos 80% do quociente eleitoral, pois não terá recebido nenhuma vaga ainda, de modo que sua média será calculada pelo número de votos válidos obtidos dividido por um, conforme explicado acima.
Importante dizer que essa é uma hipótese de acontecimento bastante rara. Na eleição de 2022, dos 513 deputados federais eleitos, estima-se que apenas 7 tenham sido eleitos por essa fase de distribuição das sobras das sobras.
No vídeo a seguir expliquei essas regras:
O Barbosa Bezerra Lima Advocacia presta assessoria jurídica para pré-canidatos, candidatos e partidos/federações de todo o país. Para mais informações, entre em contato via WhatsApp: clique aqui.